Na
expectativa de uma promessa
Nossa
história assim começa
- Seu
presente mais útil, esse é o critério!
As
palavras povoaram minha mente
Sem
saber o que pensar, mas simplesmente,
Ansiosa
pra acabar com o mistério.
- O que é? Responda-me de uma vez!
- O que é? Pare já com a insensatez!
De não
falar sobre o presente esperado
- O que é? Não me deixe no escuro!
- O que
é? Ou me diz de uma vez o que procuro
Ou ao
inferno para sempre está fadado!
Vão-se
os dias, as semanas, vai-se o mês
Já perdendo
de vez a lucidez
Em
virtude da enorme ansiedade
Tenha
foco, criatura!
Concentre-se
na aula e na leitura
Cedo ou
tarde já acaba essa maldade!
Ai que
o Tempo é amigo se veloz
No
vazio e no escuro é algoz
Que alquebra
pensamento e vontade
Passa o
tempo, passa, passa assim ligeiro
Traz
pra mim o meu presente verdadeiro
Minha
paz abandonada, na verdade.
Finalmente
chega o grande, grande Dia!
E em
mim já não cabia a alegria
E o
alívio em pôr fim ao sofrimento
Meu
presente! O que será? Eu quero ver!
E a
surpresa tomou conta do meu ser
Que ao
vê-lo me fugiu o pensamento...
- É um
carro? É meu carro? Diz que sim!
Alegria
que invade e não tem fim
- É seu carro, pode entrar, fique à vontade
Ai que
sonho azulzinho e tão lindo
Ah
querida, não consegue nem sonhar com que está vindo
É amor,
é paixão, felicidade!
Nesse
dia eu ganhei um companheiro, sim! Um amigo para todas as horas que me levava aonde eu queria!!! Meu querido Escort Azul, meu querido Josys (sim, esse era o
nome dele) passou 5 longos anos ao meu lado dos quais acredito que ¼ do tempo
tenhamos passado na oficina, sempre juntos.
Eu
estava no quarto ano da faculdade quando ele entrou na minha vida, e como eu já
disse, o transporte em Botucatu é simplesmente patético! Eu amava aquele carro
com todas as minhas forças! Nada como a liberdade de você poder sentar a sua
bunda no carro a qualquer hora do dia ou da noite e não ter que se preocupar
com a hora de voltar, se o maldito do ônibus vai estar cheio, se você tem
carona para ir pra casa... simplesmente você entra e aproveita.
E
dirigir? Eu amo dirigir! As pessoas podem não amar estar comigo dentro do carro,
porque eu adoro dirigir sozinha, numa rua deserta e sem idiotas a minha volta!
Sim eu sou como o Pateta no trânsito, eu reclamo, eu xingo, eu amaldiçoo, mas
tudo dentro da educação e privacidade de meu próprio veículo, porque não tem
nada mais deselegante que a pessoa colocar a cabeça para fora da janela e
gritar pra outra! Sejamos loucos, mas tenhamos classe!
Os
meses foram se passando e eu sempre na companhia do meu amigo, me formei,
voltei com meu Josys para casa até que um belo dia logo após nossa mudança de
casa, minha mãe e eu estávamos voltando para casa à noite após o trabalho e eis
que Satanás se apresentou a nós na forma de uma lombada não sinalizada que foi
ultrapassada a toda velocidade...
Sabe
aquelas cenas no cinema quando o carro passa voando pelo obstáculo e cai ileso
no chão continuando a perseguição? Não é assim que acontece! Você toma um susto
desgraçado, bate a cabeça no teto do carro e quando ele bate no chão, você não
tem certeza nem se as rodas continuam no lugar... sim elas continuavam no
lugar, mas só elas!!!!
Nosso
escapamento caiu, o câmbio soltou, a roda entortou e você acha que o Josys nos
deixou na mão? Nananinanão! Chegamos em casa! E no dia seguinte, chegamos no
mecânico! E aqui se inicia uma história de amor que me rendeu 4 meses de tardes
infindáveis sentada dentro do carro com um mecânico que só faltava fazer a
dança do acasalamento em volta do carro e uma conta de 10 mil reais num carro
que não valia 2...
Agora
vou explicitar a vocês tudo o que aprendi sobre carros nesses longos meses: os
carros são constituídos de pequenos pedaços do inferno interligados de tal
forma que o demônio tem a liberdade de ir e vir em todas as peças e quebrar a
que melhor lhe aprouver na hora.
É
mais ou menos assim: você está andando feliz com seu carro, então a caixa da
direção hidráulica quebra, você vai la e conserta, aí não é bem isso, porque a
bomba da direção também está quebrada e você paga para consertar as duas e
nenhuma delas é consertada, assim todos os dias em que você vai sair de casa
precisa fazer um esforço hercúleo para mover o volante para conseguir chegar ao
posto de gasolina e comprar o óleo de direção, e eventualmente, o cabo da direção
arrebenta...
Tudo
bem, vocês estão indo bem e todos os dias você volta pra casa com seu carro.
Então um dia você está andando na Radial Leste, sente um pequeno tranco e eis
que suas marchas não trocam mais... Tudo bem, vamos ver o que é! Lá se foi meu
coxim de câmbio! Vamos trocar. Você troca ele toda confiante de que o problema
foi solucionado, ótimo! Vai pra casa e no dia seguinte está andando toda
bonitona e eis que o familiar tranco te pega de novo... e por que? Porque
pasmem, o carro tem 2! Aí você tem que trocar o outro! Tudo bem! Você vai ficar
bem, Josys!
Então
se iniciam os vazamentos. A quantidade de óleo que pode vazar de um carro é
mais ou menos a quantidade de água que existe no oceano. E os vazamentos vêm de
todos os lugares. Você estaciona o carro, e na hora de sair confere pra ver se
todas as suas pocinhas de óleo estão em ordem. Ai de mim se uma delas não
estiver vazando o suficiente!
Então
você vai resolver esse problema! Por favor, tire o vazamento. Ok. Pra isso
precisaremos passar o seu carro pelo moedor e depois remontar cada parte. Combinado!
Vamos consertar o carter. Ahhhh, que pena não é só isso, você precisa trocar
agora os coxins do motor, porque o seu motor está pulando.. Ahhhh, mas não é só
isso, vamos ter que fazer o cabeçote... Ahhh, mas veja bem! Vamos aproveitar e
arrumar de novo a direção hidráulica, vamos trocar o painel, vamos arrumar a
parte elétrica, você precisa trocar o cebolão, o farol, as velas, os cabos de
vela, a bomba d’água e o reservatório da água, por que, nossa, ele acaba de
estourar! Você já viu como está velha essa coreia dentada? E o esticador? Vamos
trocar também, porque já está ficando perigoso! Seus pneus estão ruins! Vamos
trocar também!
Ok,
vamos fazer tudo!!!! O carro vai ficar novinho! E assim eu passava minhas
tardes! Sentada no carro, conversando com os mecânicos, sendo enganada e
perdendo dinheiro! Estávamos evoluindo bem!
Chegou
o grande dia! O dia em que veríamos se tudo estava no lugar! O dia da lavagem
do motor para comprovar que não haviam mais vazamentos!!!! Ai que emoção! Me
dirigi ao lavador de motores até um pouco trêmula após passar por todo esse
processo para ver o resultado!!!
- Pode lavar tudo, moço! Lava dentro, fora, o
motor, embaixo, tudo! Tira a zica e leva embora!
E
assim se iniciou a lavagem completa do Josys! Que beleza! Ele nunca ficou tão
limpinho!!! Ótimo, liga o carro e pode ir embora!
Liguei
o carro, engatei a primeira, o carro estava ótimo, desci a calçada para entrar
na rua dando seta e, eis que... o carro não tinha freio... Só o freio de mão
para parar aquela criatura! Parei o carro, desci e fui la conversar.
-
Ah, moça, isso pode acontecer... volta lá no mecânico que ele da uma olhada...
A
essa altura do campeonato eu já estava arrancando o pêlos do c* com pinça dente
de rato de tanto ódio! Vamos voltar pra merda o mecânico!
-
Negão, o carro ta sem freio...
-
Oh, Coração, deve ser o hidrovácuo, vamos ver.
Arruma
o hidrovacuo, troca o tal do burrinho mestre, troca patins de freio, troca
pastilha, troca óleo, troca tuuuudo que for relacionado a essa merda desse
freio, mas faz essa bosta funcionar!!!!! E assim foi... e todos os dias eu
voltava pra ficar colocando fluido de freio e bomba bomba bomba bomba o kct do
pedal...
Desisto!
Vou levar meu filho pra morrer em casa! E assim foi! Peguei meu Josys, terminei
meu relacionando com o Negão da oficina e fui pra casa!
A
vida com o Josys era sempre uma aventura, porque no dia em que você conseguia
sair de casa, podia ser que você não conseguisse voltar... E, um dia, após minha
mãe ser operada para retirada de cálculo renal, fui buscá-la no hospital e, por
volta das 2h da manhã, estávamos chegando em casa quando a embreagem estourou e
ficamos na rua...
O
Josys era tão malandro que conseguia quebrar sempre em um lugar ajeitadinho
onde não atrapalhasse a passagem, ou pertinho de casa, ou em frente ao
mecânico... fomos para casa e no dia seguinte o guincho levou ele para Bragança
para ser consertado...
Passados
2 meses, fomos buscar o bonito em Bragança na casa do meu irmão! Que emoção! Eu
ia rever meu amigo! Entramos no carro, as marchas passavam loucamente e quando
estávamos no meio da estrada ele simplesmente perdeu o freio. Quem precisa de
freio na estrada? Afinal estamos aqui pra andar ou pra parar? As
habilidades “dirigísticas” mitológicas de minha mãe nos levaram sãs e salvas
para casa! Ufa! Pelo menos o Josys está em casa!
Os
meses se passaram e lá íamos nós duas trabalhar todos os dias sem freio, sem
dinheiro, sem documento e com muita fé de que voltaríamos para casa ao final do
dia!
Então
a saga dos pneus se iniciou. Sabe quando o carro fica completamente torto e não
há Cristo que consigo alinhar o desgraçado? Esse era o Josys, parecia aquelas
crianças raquíticas de perninhas tortas... Isso nos rendia um pneu por semana.
A essa altura do campeonato eu já era praticamente uma borracheira. Já nem
prendia muito bem a roda pra não ter que fazer muita força na hora de trocar de
novo no dia seguinte.
Houve
uma ocasião que acordamos cedo para trabalhar, aquela chuva lazarenta gelada
estava caindo e a garagem em casa não é coberta. E lá fomos nós trocar o
pneu... Minha mãe segurando o guarda-chuva e eu trocando o pneu... Pega chave
de roda, afrouxa os parafusos, coloca o macaco, sobe, sobe, sobe, tira os
parafusos, troca o pneu, coloca os parafusos de novo, aperta um pouco, baixa o
macaco e eis que: o estepe estava furado... CARALHOOOOOOOOOOOO. A merda do
estepe estava mais murcha que o pneu que eu havia tirado! O que fazer? Vamos
colocar o pneu velho de novo e torcer pra Nossa Senhora da Borracharia abrir os
caminhos até encontrarmos alguma para trocar o maldito! Tudo bem, Josys, nós
conseguimos e fomos trabalhar!
A
peça mais infame que Josys nos pregou foi uma bela noite de comemoração! Minha
avó havia acabado a quimioterapia e a radioterapia e saímos para comemorar! Que
delícia! Saímos do trabalho na Vila Mariana às 22h, pegamos a véia, colocamos
no carro e fomos comer comida japonesa que ela adora!
Chegamos
ao restaurante, o garçon gentilmente nos convidou a nos retirarmos devido ao adiantado
da hora. Ok! Vamos a outro lugar... Todo mundo animado, afinal era a vitória da
minha veínha! Saímos com o carro, e estávamos subindo a Sena Madureira e, ahhh, o
Josys, que maroto... No meio da subida, a roda de trás simplesmente caiu! PUF!
Sem quê nem pra quê, a roda soltou! Mas você acha que o Josys parou de andar
por causa disso? Jamais!!! Chegamos ao posto de gasolina, encostamos o carro,
chamamos o guincho e fomos andando em grande estilo até o Mc Donald’s 24
horas...
Ultrapassamos
todas as dificuldades juntos. Josys carregou todas as festas da nossa escola,
festas para 150 pessoas e o azulzinho trabalhando loucamente, fez nossa
mudança, nos levava pra casa todos os dias (quando chegava). Era um lord. Não
tem água? Tudo bem, vou parar aqui e não vou fundir o motor, porque eu sei que você
esqueceu e vou te dar outra chance... Ahhh, acabou o óleo??? Tudo bem, eu vou ficar
aqui quietinho sem ligar até você perceber o que eu estou querendo... Um menino
de ouro!
O
bichinho tava tão acabado já que um dia, depois de ter quebrado, meu irmão nos
emprestou o carro dele para trabalharmos e, quando paramos no posto, o
frentista veio dar os parabéns por finalmente termos trocado de carro...
Mas
eventualmente, a “sorte” finalmente se cansou do Josys e um belo dia, voltando
do trabalho ele quebrou... Minha mãe me ligou avisando que ele havia quebrado
numa esquina de uma praça que era subida e não havia como tirar ele de lá...
Tudo bem! Vamos te buscar amanhã, Josys! Descanse essa noite que tudo vai ficar
bem!
A
agonia da noite foi passando e eu não sabia como poderia buscar meu Josys, não tinha
ninguém para ajudar, as pessoas que se propuseram a ajudar, não ajudaram, eu não
tinha dinheiro para o guincho e só ia receber na próxima semana, eu
simplesmente não sabia o que fazer. Conversei com meu vizinho mecânico que
conseguiu um guincho mais barato!!!! Meu Deus! Finalmente um milagre!!!!
Liguei
para o guincho para confirmar o preço, falei com meu irmão para ir confirmar o
endereço de onde ele estava parado para que o guincho fosse buscá-lo e... ele
já havia partido...
Meu
querido amigo não estava mais lá e não havia nem uma placa da CET pedindo
resgate... ele simplesmente sumiu... E esse foi o fim de meu querido amigo que
levou consigo meu GPS, meus óculos de Sol, meus pneus novos trocados naquela
semana, um tanque transbordando de gasolina, meu CD da Legião e uma bateria novinha... Vai com Deus, meu querido Josys, e obrigada por todas as nossas aventuras...